Nos últimos anos, o mundo corporativo testemunhou uma mudança significativa em relação à jornada de trabalho, principalmente com o advento do trabalho remoto ganhando força em uma variedade de setores. No entanto, à medida que a dinâmica do ambiente de trabalho é influenciada pelo comportamento contemporâneo dos trabalhadores, uma parcela das empresas tem optado pelo retorno gradual ao trabalho presencial.
Uma das razões que têm impulsionado a volta dos modelos híbridos ou totalmente presenciais é o surgimento do conceito de “hush-cation” ou “férias silenciosas”. Essa nova tendência desperta algumas preocupações entre os empregadores, uma vez que implica que os funcionários realizem suas tarefas em ambientes não convencionais, o que teoricamente poderia afetar suas entregas e desempenho.
Segundo a RVshare, plataforma online que funciona como um mercado de aluguel de trailers nos Estados Unidos, as “férias silenciosas” estão se tornando mais comuns entre trabalhadores remotos. Em 2023, 36% da Geração X e dos millennials que trabalham remotamente já tinham uma dessas viagens planejadas.
Em consonância com as preocupações do mercado, Luciana Lima, professora do Insper e especialista em liderança e gestão de pessoas, destaca que o conceito de “férias silenciosas” deve considerar a natureza legal das férias, que são uma prerrogativa do empregador, não do empregado. “É essencial compreender o tipo de vínculo empregatício, especialmente em contratos regidos pela CLT, onde a determinação das férias é exclusiva do empregador, conforme estabelecido pela legislação”, destaca.
No contexto do trabalho remoto, é imprescindível que a empresa esteja ciente da localização geográfica do funcionário durante o período de trabalho. Isso é fundamental para garantir a disponibilidade em situações emergenciais. “A falta de comunicação sobre a localização pode acarretar em complicações operacionais para a empresa”, ressalta a especialista.
Um estudo realizado no ano passado pela Owl Labs, empresa especializada em dispositivos de videoconferência em 360°, revelou uma disparidade de opiniões entre gestores e trabalhadores remotos no que diz respeito à produtividade.
Os resultados apontaram que 60% dos líderes expressam preocupação com a possibilidade de os colaboradores serem menos produtivos trabalhando remotamente, ao passo que 62% dos profissionais afirmam sentir-se mais produtivos nesse modelo de trabalho.
“Embora o termo ‘férias silenciosas’ possa envolver aspectos relacionados à produtividade, qualidade de vida e bem-estar, também há uma parte da responsabilidade que recai sobre o próprio empregado em relação às suas atividades e resultados”, expõe a especialista.
Para muitos profissionais esse conceito representa uma estratégia eficaz na prevenção do burnout e na manutenção da satisfação no trabalho, ajudando a evitar que os colaboradores remotos se sintam sobrecarregados a ponto de abandonar seus empregos. “Aqueles que apoiam essa prática acreditam que ela pode fortalecer a moral dos trabalhadores, promovendo um melhor equilíbrio entre vida pessoal e profissional”, enfatiza Lima.
A pesquisa revela ainda que 83% dos trabalhadores remotos relatam operar no mesmo nível ou em níveis superiores de produtividade nesse regime. Esses resultados ressaltam as perspectivas divergentes sobre o trabalho remoto e sua relação com a eficácia no trabalho.
Em um mercado de trabalho que passa por constantes transformações, outro ponto que deve ser destacado é o papel da lealdade entre empregados e empresas. Enquanto o conceito de “férias silenciosas” ganha proeminência, é essencial compreender as sutilezas desse vínculo e reconhecer sua relevância para a sustentabilidade das relações de trabalho.
“A lealdade é uma via de mão dupla, exigindo comprometimento tanto dos colaboradores quanto das organizações. Em meio a percepções de baixa lealdade é essencial uma análise cuidadosa, indo além de generalizações, para compreender a profundidade desse relacionamento e seu valor para ambas as partes”, conclui a professora de Liderança e Gestão de Pessoas do Insper.
Sobre Luciana Lima:
Doutora pela USP e mestre pela FGV em Administração e professora do Insper nas disciplinas de Gestão de Pessoas e Liderança. Autora de dois livros (HR Business Partner e Estratégia de Pessoas nos BRICS) e mais de 15 artigos científicos, sendo inclusive um deles premiado no SEMEAD/2017 e com menção honrosa pelo British Academy of Management/2019.
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GABRIELI ALBUQUERQUE SILVA
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